Passado permeia eleição no Uruguai

Ex-guerrilheiro, ex-presidente e filho de ex-ditador concorrem à presidência; plebiscito decide sobre anistia a militares

Um ex-guerrilheiro tupamaro, um ex-presidente da república que tenta voltar ao poder 20 anos depois de sua primeira eleição e um jovem com pouca experiência política que é filho de um ex-ditador são os três principais candidatos à sucessão presidencial do socialista moderado Tabaré Vázquez. O ex-guerrilheiro é José Pepe Mujica, da coalizão governista Frente Ampla, que tem 44% das intenções de voto, segundo pesquisa da consultoria Factum. O ex-presidente é o liberal Luis Alberto Lacalle, candidato do Partido Nacional, também conhecido como Partido Branco. Ele tem 31% das intenções de voto. O filho do ex-ditador é Pedro Bordaberry, que no início desta década foi ministro do Turismo e concorre pelo Partido Colorado, tendo 12% das intenções de voto. Nesse clima de retorno ao passado, 2,5 milhões de uruguaios vão hoje às urnas para eleger o novo presidente. Além das votações para presidente e para renovar o Senado e a Câmara de Deputados, serão realizados dois plebiscitos simultâneos. O primeiro definirá se será anulada - ou não - a "Lei de Caducidade Punitiva do Estado", conhecida como lei de anistia, aos militares que cometeram violações aos direitos humanos na ditadura militar (1973-1985). A lei foi aprovada em 1986 com o objetivo de "promover a pacificação nacional". Posteriormente foi confirmada por um plebiscito. Mas os setores de esquerda afirmam que a lei foi aprovada em um contexto de medo da população por novos levantes militares e, portanto, deveria ser anulada.O outro plebiscito definirá se os 600 mil uruguaios que partiram para o exterior ao longo dos últimos 40 anos terão direito a votar por carta. Enquanto o governo defende o fim da lei de anistia e a criação do voto depositado do estrangeiro, a oposição é radicalmente contra.PESQUISASAs pesquisas afirmam que a Frente Ampla não conseguirá os 50% mais 1 dos votos necessários para vencer no primeiro turno. Mujica não conseguiu beneficiar-se da boa imagem do presidente Tabaré, que tem 60% de aprovação popular."Em linhas gerais, levando em conta que o contexto internacional foi favorável, Tabaré fez uma boa gestão. E por isso exibe bons índices de aprovação popular", disse ao Estado o economista Gabriel Oddone. Mujica causa preocupação no setor financeiro com suas promessas de acabar com o sigilo bancário do Uruguai, considerado o paraíso fiscal da região. Ele diz, porém, que seu modelo de esquerda se aproxima do estilo moderado do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva - e não do radicalismo do venezuelano Hugo Chávez. Lacalle também causa desconfiança: embora liberal, não se comprometeu em alterar a forte presença estatal na economia.Para os empresários, a questão é chave. O próximo governo, dizem, precisará modernizar a infraestrutura do país. Mas, para isso, precisará privatizar o controle de portos, rodovias e ferrovias - tema considerado tabu para os uruguaios.

Ariel Palacios (Estadão)