Mordomo da vez ou cortina de fumaça

Artigo de Valdo Cruz na Folha

O Palácio do Planalto está à procura de um culpado, alguém que possa ser responsabilizado pela mais nova confusão em que se meteu: a divulgação daquilo que está sendo chamado de dossiê, publicado pela imprensa nos últimos dias, com dados de gastos da época do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. A torcida interna é que as investigações apontem para um funcionário antigo, que tenha sido herdado dos tempos de FHC. Alguém que teria trabalhado como um espião e acessado o banco de dados palaciano no intuito de criar problemas para o governo Lula. Seria o desfecho ideal na avaliação de governistas. Tudo não teria passado de um complô tucano. A crise estaria resolvida. Possível? Sim.

Mas há quem no Planalto que trabalhe com outra tese. O vazamento pode ser obra de fogo amigo, um petista que enxergou uma oportunidade para enfraquecer a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil). De estilo pouco agregador e até autoritário, a chefe da Casa Civil coleciona inimigos dentro e fora do Palácio do Planalto. Não é de hoje que ex-auxiliares costumam fazer comentários atacando Dilma e seu estilo trator. Não será difícil encontrar algum que ainda esteja trabalhando a seu lado e possa ter visto no dossiê uma forma de vingança.

Agora, sejamos céticos, tudo pode não passar de cortina de fumaça. Afinal, na política de administração de danos palaciana, jogar toda culpa da crise no vazamento dos dados é a melhor estratégia do momento e, quem sabe, o único caminho que restou. Afinal, daqui alguns dias, o Palácio do Planalto poderá dizer que, apesar de todos os esforços, a comissão de sindicância não conseguiu identificar o tal funcionário responsável por divulgar os dados para a imprensa.

E motivos para ceticismo existem. Afinal, antes de o dossiê ganhar as páginas da imprensa, ministros e líderes governistas ficavam alardeando para jornalistas dados que poderiam comprometer o ex-presidente FHC e seus auxiliares. Por sinal, ainda continuam falando a mesma coisa. Dizem que, quando a documentação chegar aos arquivos da CPI dos Cartões Corporativos, muito assessor de FHC terá dificuldades para explicar seus gastos naquele período tucano. Esse comportamento, por si só, demonstra que havia interesse do governo atual em acuar a oposição e retirar seu apetite em investigar as contas do presidente Lula. Daí para fabricar um dossiê trata-se de um pulo.

Por enquanto, porém, vamos ficar nas suposições. Um ponto que pesa a favor do governo é que o tal de dossiê é praticamente inofensivo, não contém nenhuma informação que possa comprometer a gestão tucana. Teremos de aguardar os próximos capítulos dessa mais nova novela petista. O risco é que, como outras, fiquem sem um final.