Inflação volta a assustar Lula

Na Kennedy Alencar, Na Folha

O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) perdeu para o risco de inflação o primeiro lugar entre as preocupações principais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O presidente continua em suas viagens para "inaugurar" ordens de serviço do PAC, telefona para ministros quando é informado de que algum projeto anda mal das pernas e fala todo dia com Dilma sobre "a menina de ouro" de seus olhos, como disse na sexta-feira (09/05), na Bahia.
No entanto, nas últimas semanas, Lula teve de dar o braço a torcer ao presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. A turma do BC já vinha dizendo fazia tempo que havia risco de alta dos preços e que essa ameaça não era nada desprezível. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, rebatia a tese do BC. Minimizava tal risco. Pois bem.
A inflação acumulada nos últimos dozes meses pelo IPCA ficou acima de 5%. O IPCA, Índice de Preços ao Consumidor Amplo, é a taxa usada como referência no sistema de metas de inflação. O centro da meta é de 4,5% ao ano. O índice real, portanto, está se afastando do centro.
Há uma margem de dois pontos percentuais para cima ou para baixo a fim de acomodar choques etc. Mas, no sistema de metas de inflação, mira-se no centro. O BC agiu como de costume. Elevou os juros na última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária). A Selic, a taxa básica de juros da economia, passou de 11,25% para 11,75%. A subida de meio ponto percentual foi uma pancada. Surpreendeu Lula.
O presidente, então, passou a cobrar de Mantega medidas contra a inflação que fugissem da receita tradicional de aperto monetário (subir os juros para conter o consumo e segurar os preços). É nesse contexto que o governo passou a estudar a elevação do superávit primário dos atuais 3,8% para até 5% do PIB (Produto Interno Bruto). O superávit primário é a economia do setor público para pagar os juros de sua dívida.
Na proposta em estudo por Lula, essa elevação teria um modelo diferente. O valor excedente a 3,8% seria destinado ao chamado fundo soberano _mecanismo que ficaria sob controle da Fazenda para compra de dólares, que seriam usados em projetos de investimento do Brasil no exterior.
Como haveria maior aperto fiscal, a demanda interna não seria estimulada. Ou seja, ocorreria menos pressão inflacionária. O BC, então, poderia ser menos rigoroso ao elevar os juros. A cada aumento da Selic, há estímulo à entrada de dólar, porque a taxa real brasileira já é a mais alta do mundo e vale a pena o investidor trocar dólares por reais. Além disso, aumenta o custo da dívida pública.
O fundo soberano necessitaria de dólares para financiar projetos no exterior, o que não aqueceria a economia a ponto de gerar mais pressão inflacionária. O Tesouro compraria a moeda americana e ajudaria, ainda que levemente, a reduzir a quantidade de dólares no mercado.
Lula estuda com atenção a proposta, feita pelo economista Luiz Gonzaga Belluzzo, identificado com os chamados desenvolvimentistas. O presidente sabe que a força de sua popularidade vem da economia. Inflação baixa é um ativo político. Lula está bastante preocupado com o aumento do preço dos alimentos de consumo popular.
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A política como ela é
Dilma Rousseff marcou um golaço na quarta-feira (07/05) ao depor no Senado. Contou com o misto de deselegância e conservadorismo do senador José Agripino Maia (DEM-RN) para se sair bem no confronto com a oposição a respeito do dossiê contra tucanos feito na Casa Civil. A reação de euforia de petistas e aliados foi imediata: nascia ali uma grande candidata à Presidência.
Menos, menos.
A candidata já nasceu faz tempo. Tem sido levada a tiracolo por Lula em todas as viagens da caravana do PAC. Por ora, é a principal aposta do presidente.
No entanto, Dilma ainda tem um longo percurso pela frente. No Senado, demonstrou calma e segurança. Mas mentiu. Ela já sabia que José Aparecido Nunes Pires, o chefe do Controle Interno da Casa Civil, era o vazador do dossiê.
Esse episódio dificilmente derrubará Dilma. Mas pode lhe deixar uma mancha incômoda no caminho da candidatura ao Palácio do Planalto. Muito forte, seu padrinho político tem cacife para insistir na empreitada. Mas convém aguardar os próximos capítulos da novela. A alegria do depoimento no Senado se transformou em preocupação com a identificação pública no dia seguinte de que um militante histórico do PT e assessor da Casa Civil tinha vazado o dossiê para a oposição.
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Casablanca
Como diria o inspetor Louie Renault, "prendam-se os suspeitos de sempre". O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu está virando uma espécie de culpado de plantão. Daqui a pouco vão relacioná-lo ao caso Isabela.
O vazador do dossiê, José Aparecido, é um assessor do governo que foi próximo a Dirceu. Achar que essa ligação legitima a suspeita de fogo amigo de Dirceu contra Dilma é desinformação. Dirceu e Dilma são amigos. O ex-ministro embarcou no projeto presidencial dela até o pescoço. Dirceu atua noutro sentido. Está empenhado na operação "Segura Zé Aparecido".