Lula refaz a caravana com Dilma

BRASÍLIA - Quinze anos depois de promover a Caravana da Cidadania que começou no Vale do São Francisco e na qual se apresentou como timoneiro de um barco rumo à campanha presidencial (que seria vitoriosa oito anos mais tarde), o agora presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva refaz parte do trajeto levando a bordo – de barca, carro e helicópteros – a candidata escolhida para a sua sucessão, Dilma Rousseff.
Desta vez, apesar das diferenças – são apenas três dias e a visita é oficial, para vistoriar obras da transposição do Rio São Francisco – não é surpresa para base e oposição que a rota cruze com o mapa político traçado pelo chefe da nação. Ao passo que cobra andamento das atividades – que poderão beneficiar 12 milhões de pessoas – Lula quer fazer Dilma conhecida da população. Fará até discurso para operários numa das etapas, com a aliada a tiracolo, na viagem que começa amanhã e vai até sexta-feira.
A investida divide o Congresso e promete esquentar o debate político esta semana. Enquanto a base governista ensaia a defesa apontando roteiro institucional, porque Dilma é a “mãe do PAC”, a oposição já escalou olheiros para acompanhar, mesmo de longe, passo a passo da dupla, a fim de denunciar ao Tribunal Superior Eleitoral qualquer passo em falso que conote campanha antecipada.
– Há duas semanas a ministra Dilma está com uma agenda puramente eleitoreira atrelada a máquina do governo – acusa o deputado Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA) – Até agora a oposição não conseguiu colocar um freio nisso. Precisamos ser mais enérgicos.
Líder do PSDB na Câmara, o deputado José Aníbal (SP) afirma que a oposição tem feito o que pode e impetrado diversas ações na Justiça para impedir que a máquina seja usada na pré-campanha da candidata. O problema, para ele, está na lentidão da Justiça Eleitoral e na mídia, que tem dado uma cobertura de candidata à Dilma.
– As grandes obras do governo no Nordeste estão quase todas paradas, inclusive obras da transposição do São Francisco – critica o líder. – É uma coisa escandalosa. Dilma vai ao Pará participar de procissão (Círio de Nazaré) enquanto deveria ir ao estado fazer com que as obras do PAC andem.
Defesa
Para a base governista, a oposição está sem discurso e as críticas mostram desespero. Líder do PT na Câmara, o deputado Cândido Vaccarezza (SP) diz que a presença da ministra é absolutamente normal, já que ela é coordenadora do PAC. E defendeu: não há nenhuma obra da transposição parada.
– Às vezes você não consegue cumprir a risca os calendários das grandes obras. Você está à frente em alguns momentos e atrás em outros – explica o parlamentar – Mas uma coisa é fato. O Brasil nunca esteve tão bem economicamente e esse desenvolvimento não caiu do céu. É fruto de muito trabalho. A oposição ainda há de se desculpar pelo que fez enquanto governou o país.
Na opinião do senador Álvaro Dias (PSDB-PR), a companhia constante de Dilma nas viagens de Lula passa a impressão de que ela é a primeira-ministra de um sistema “que nem parlamentarista é”.
– É como se ela fosse responsável por todas as obras e não houvesse outros ministros – lamenta o senador.
Para o tucano, a atitude de Lula de “antecipar desnecessariamente” o processo eleitoral está estimulando governadores e prefeitos a usarem a máquina pública a serviço de projetos eleitorais. Tudo isso com o aval oficial da Justiça eleitoral. Dias, no entanto, afirmou que os advogados do PSDB “estão de olho no desenrolar da viagem pelo São Francisco para verificar se não haverá abusos que possam resultar em nova representação da oposição na Justiça”.
Apesar de achar que a oposição está cumprindo seu papel, a senadora Serys Slhessarenko (PT-MT) afirma que a presença de Dilma nada tem a ver com campanha presidencial e sim com a responsabilidade que a ministra tem com as obras do governo Lula que ela coordena com “determinação e força”. A visita, de acordo com Serys, será fundamental para ver o que é preciso fazer para acabar com eventuais paralisações de obras determinadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que defende a presença de Dilma na viagem, “uma vez que ela é responsável pelos investimentos na obra”, espera que o presidente Lula aproveite para conversar com o bispo Luis Flávio Cappio, que já fez duas greves de fome, em 2005 e 2007, contra a transposição do rio.
– Ouvi dizer que o bispo foi aconselhado a não estar presente quando o presidente passar – afirma Suplicy. – Acho um erro ele não estar lá. E Lula deveria procurá-lo mesmo que seja para ouvir um ponto de vista divergente.

Luciana Abade, Jornal do Brasil