José Maria Quadros de Alencar
Desembargador Federal do Trabalho
http://blogdoalencar.blogspot.com/
Recebi de Flávio Nassar, Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e Coordenador do Fórum Landi da Universidade Federal do Pará - UFPA, um artigo em que propõe a refundação da nossa Alma Mater.
Em certa passagem, ele afirma que o professor comprometido com as causas sociais e coletivas, que aliava atividade intelectual com uma práxis política, foi sendo substituído pelo atual do padrão MEC-Capes-CNPQ que, a despeito da grande especialização e títulos, é muitas vezes analfabeto político, como definiu Brecht. Correndo atrás dos índices de produtividade exigidos pelo modelo atual "publish or perish" (publicar ou perecer) - continua Flávio - perde-se o compromisso crítico e exacerbam-se os egos e o individualismo. Neste universo - arremata Flávio - a preservação do status quo é sempre uma tendência.
Respondi com uma mensagem despretensiosa, com cópia para os demais destinatários, e como recebi retorno positivo e incentivo de um deles, resolvi reescrevê-la e publicá-la aqui.
Começo dizendo que concordo com o programa proposto por Flávio Nassar para refundar a nossa Universidade.
Mas penso, ainda que provisoriamente, que o uso de indicadores de desempenho, por si só, não é algo malsão.
Talvez tenha que haver um aprimoramento das - e nas - métricas, que é o grande problema delas todas. Quem adota métricas nunca está satisfeito com elas e sempre busca melhorá-las. O que é impossível é não tê-las. Uma comunidade acadêmica é um bem de todos, um enorme capital intelectual e tem que ser bem administrado. Tem que haver uma gestão do conhecimento acadêmico. Por isso tem que existir métricas. Quem não mede não administra.
Se o modelo MEC-CAPES-CNPQ não é o melhor, tem que ser aperfeiçoado, mas não podemos prescindir das métricas.
Pelo que pude perceber da crítica de Flávio Nassar, ele não se conforma com o foco - talvez excessivo e exclusivista - na publicação de trabalhos. Também tenho críticas a esses rituais de validação do saber acadêmico, que podem estar levando a um publicar por publicar e ao surgimento de curriolas acadêmicas. Na minha área - direito - se publica muita coisa ruim - e muita coisa boa também, é claro - e os mecanismos de validação acadêmica deixam muito a desejar, pelos resultados que constato no nosso dia a dia forense. O direito é uma técnica relativamente decadente, quando comparada com outras técnicas em clara ascensão, mas os juristas não percebemos isso. E os circuitos de validações acadêmicas continuam produzindo estrelas e luminares que, na verdade, podem muito bem estar levando o direito para um buraco negro, com força gravitacional forte o bastante para não deixar que a luz saia dele. Técnicas bem mais jovens - administração e economia, para dar dois exemplos - passaram na frente do direito, bem mais antigo. Mas os juristas não percebemos isso e continuamos produzindo títulos e artigos indexados, que em boa parte servem para pouca coisa ou quase nada. Assim, o progresso da ciência e da humanidade prescindirá de nós, juristas, da academia ou de fora dela, mas ainda assim fingimos estar dando uma contribuição relevante para uma e outra.
Imagino que algo parecido acontece em outros ramos do conhecimento.
Por isso tendo a concordar com Flávio Nassar, ainda que parcialmente. As métricas atuais estão produzindo distorções e por isso precisam ser aperfeiçoadas. Talvez para incorporar indicadores de desempenho dos acadêmicos vinculados ao resultado efetivo de seus artigos, dissertações, teses, monografias e ensaios. Por exemplo: qual o impacto de um artigo de um doutor em medicina sobre a taxa de mortalidade infantil? Qual o impacto de uma tese de direito penal sobre os índices de violência urbana? Qual o impacto de uma dissertação de mestrado de um agrônomo para o aumento da produção e produtividade agrícola regional?
Talvez assim a produção acadêmica passasse a ter uma direção e um centro que não fosse o próprio umbigo dos orientadores e orientandos.
Se o que estou dizendo está fora da realidade, por favor, desconsiderem tudo o que eu disse, pois estou fora da academia e posso estar simplesmente equivocado. E com direito, por isso mesmo, ao benefício da dúvida. Metódica inclusive.