O debate teórico-político começa a esquentar na UFPa.

O Reitor Alex Fiúza expressou em entrevista no Jornal Beira do Rio suas posições sobre as
regras que devem organizar o processo sucessório na UFPa. Fernando Arthur, professor da UFPa e militante da oposição docente, de pronto, diverge das posições do Reitor e em artigo no Diário do Pará expressa suas posições sobre a mesma temática.

Vejamos as duas posições em debates:


ENTREVISTA
“Temos de ter maturidade para acatar a decisão do Consun”
Reitor explica que os docentes são os que têm maior responsabilidade na administração acadêmica por Adaucto Couto
TÁRSIO SARRAF
Alex Fiúza de Mello: “‘Casuísmo’ é burla de lei e a lei estabelece os 70%”
O processo de escolha do próximo reitor da Universidade Federal do Pará começou com a publicação dos editais para a eleição. Apesar da Câmara de Legislação e Normas ter decidido pela chamada Lei dos 70%, caberá ao Conselho Universitário definir as regras que vão valer para o pleito.
Nesta entrevista ao BEIRA DO RIO, o Prof. Dr. Alex Fiúza de Mello, atual reitor da instituição, explica que o melhor para a Universidade é seguir o que determina a lei, para evitar possíveis contestações judiciais, como no caso da UEPA e da UFRGS.
O reitor esclarece a sua posição contrária ao voto universal, pois entende que a democracia na Universidade é de outro tipo e que cabe aos professores a maior responsabilidade nas decisões sobre os caminhos que a instituição deve seguir.
Alex Fiúza de Mello fala ainda sobre as vantagens e desvantagens da eleição acontecer em dezembro ou abril, deixa claro que não vai usar a máquina da Universidade em favor de ninguém e que vai defender o nome do eleito junto ao Ministério da Educação, independente de quem seja.
BEIRA DO RIO - A UFPA deu início ao processo eleitoral com a publicação dos editais para a eleição do próximo reitor. Qual a sua expectativa para esse processo?
Alex Fiúza de Mello - O Regimento Eleitoral foi apresentado pela Câmara de Legislação e Normas e deve ser executado conforme a Lei 9192, de 1995, que determina o peso do voto dos professores em 70%. O Conselho Universitário pode alterar esse critério se assim o desejar. No entanto, há problemas em diversas universidades que fizeram isto. Se houver uma contestação judicial, o processo eleitoral pode ser anulado. Temos como exemplo o caso da UEPA e, recentemente, o da Federal do Rio Grande do Sul, que tiveram problemas com o regimento eleitoral e os casos estão na Justiça. Isso é muito desgastante para uma instituição. Muitas pessoas dizem: “mas a sua eleição passada foi pelo voto paritário. Isso não é casuísmo?”. E eu respondo: não! Primeiro porque eu tinha me retirado de licença do Consun quando foram votadas as regras do jogo - não era ético eu, como candidato, coordenar o Consun. E eu me submeti às regras definidas pelo Conselho, sem a minha presença ou influência. Em 2001, quando fui eleito pela primeira vez, me submeti à regra dos 70%, quando ainda não era membro do Conselho. Em segundo lugar, “casuísmo” é burla de lei, de regra, e a lei estabelece os 70%. Espero que tenhamos maturidade para acatar a decisão do Conselho Universitário e os candidatos se submetam às regras que vão ser definidas. É muito importante para uma Universidade, durante a sucessão de um reitor, que se discutam idéias, projetos e planos de trabalho. A Universidade tem de ser exemplo de comportamento civilizado, de disputa de idéias, de liberdade de expressão e de respeito mútuo entre os atores políticos.
BR - Em 1997, houve um tumulto na eleição por causa da Lei dos 70%, inclusive com intervenção da Polícia Federal...
A.F.M.: Em 2001, também prevaleceu a Lei dos 70% e alguns dos atuais candidatos eram membros do Conselho Universitário que aprovou a regra de disputa naquela ocasião. A eleição foi tranqüila, em termos, até que o segundo colocado entrou na Justiça querendo anular a eleição, o que não aconteceu porque tudo estava dentro da lei. Em 2005, apesar do voto ser paritário, ninguém foi à Justiça, isso porque, enquanto em 2001, a diferença entre os candidatos foi de apenas 0,27%, em 2005 foi enorme, não dando margem a contestações. Nesse ambiente de tensão, o melhor é seguir a lei para que o processo possa ir até o fim, sem maiores atropelos
BR - Caso a eleição deste ano ocorra em dezembro, haverá seis meses até a posse do próximo reitor. Qual a vantagem desse interstício?
A.F.M.: Há vantagens e desvantagens de a eleição ser em dezembro ou em abril. Se for em abril, os candidatos terão mais tempo para fazer campanha e se fazerem conhecer, porém a nomeação vai sair apertada entre maio e junho. Mal vai dar tempo para o novo reitor assumir e montar seu plano de trabalho, conhecer a situação da Universidade. Se for em dezembro deste ano, poderia ser uma desvantagem o pouco tempo até a eleição, mas se para governador e prefeito o tempo é de três meses entre a inscrição e a eleição, então, o mesmo pode valer para a eleição para reitor. A vantagem é que o candidato que vencer saberá, antecipadamente, que será nomeado, terá seis meses para montar sua equipe e colocá-la para estagiar com a atual, para conhecer melhor a situação da UFPA. Quando assumir em julho, vai estar com a equipe madura, discutindo o plano de trabalho e a Universidade não perde tempo. Do ponto de vista da instituição, é positivo que haja esse maior tempo para a transição e que isso se torne normal em nossa cultura interna.
BR - Por mais que a disputa seja pela reitoria da Universidade, há partidos políticos infiltrados no processo. Aí volta a questão da defesa do voto universal. Não haverá risco de tumulto do processo como em 1997?
A.F.M.: A universidade não é a sociedade. Professor não é classe dominante; não existe “divisão de classe” entre professor, aluno, funcionário. Classe social é outra coisa. Dizer que o professor é classe dominante, porque os alunos são maioria, é uma tese completamente equivocada. Na universidade há hierarquias. Quem tem responsabilidade para com a administração acadêmica são os professores. São eles que executam as atividades de ensino e pesquisa e respondem perante à lei. A Universidade é uma república de professores, é uma instituição de ensino. O aluno não pode, por ser maioria, achar que pode definir a política de ciência e tecnologia da Universidade, porque ele não sabe ainda nem fazer pesquisa. Não se pode usar esse argumento para defender que o voto universal é mais democrático, porque a democracia na Universidade é de um outro tipo: é a liberdade de expressão, é a reunião de pares para discutir projetos, é o respeito recíproco, é o professor ensinar ao aluno tudo o que ele sabe para que o aluno seja melhor do que ele amanhã, mas não é deixar que o aluno assuma o lugar dele. Os partidos estão aí e não há problema nisso, pois a Universidade faz parte da sociedade. O que ela não pode é se transformar em partido ou se deixar conduzir por essas agremiações. Quem defende o voto universal, na verdade, defende apenas uma estratégia para chegar ao poder dentro da Universidade. Essa é uma posição minha que vou defender junto ao Conselho Universitário, mas a decisão final será do Conselho.
BR - Já há três nomes apontados como certos na disputa: Carlos Maneschy, Ana Tancredi e Luís Carlos Silveira. O senhor pretende apoiar um desses possíveis candidatos? A.F.M.: O reitor não será neutro no processo. Eu vou apoiar sim, mas meu apoio será condicionado à minha função de coordenador do processo eleitoral. Eu não vou usar a máquina da universidade para beneficiar A, B ou C. Vou manifestar minha preferência e as razões da minha preferência, o que não quer dizer que serei contra os outros candidatos. Tenho a obrigação de garantir a todos os concorrentes que o processo será limpo e que o vencedor vai encabeçar a lista tríplice. E vou defender junto ao Ministro da Educação o candidato vencedor da consulta à comunidade, independente de quem seja.
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CULTURA DEMOCRÁTICA E ELEIÇÃO NA UFPA
Fernando Arthur de Freitas Neves[1]
Professor da Faculdade de História da UFPA
O capital simbólico investido na figura do reitor não é desprezível para a legitimação da UFPa como interlocutora do projeto de desenvolvimento da Amazônia. O pronunciamento feito sobre as próximas eleições pelo professor Alex, atual ocupante da magnificência, traz uma defesa da legalidade acima de qualquer suposto político sobre o funcionamento das instituições. Examinando sua tese sobre o normativo estatuído por uma câmara de legislação contenta-se em ratificar a decisão já presente na legislação federal ao determinar a representação dos votos de 70% em conformidade com a Lei 9192/95, revalidado no Art. 89 do Estatuto da Ufpa. Isto posto, termina a discussão, basta então ficarmos a salvo das ingerências da Justiça e debruçarmo-nos no “convencimento da comunidade pelo argumento, independente das regras do jogo”.
Não creio estar filiado a algum oportunismo de plantão quando reclamo outra intervenção na cultura acadêmica que não o conformismo de injunções normativas. Considero apequenar o debate sobre os rumos da universidade como campo de saber e de conflito, pois como bem sabemos, a universidade não substitui a sociedade, mas ela é a sociedade na constituição das visões de mundo e das opções de como ordená-lo. O estado de direito não fica preservado com a assimilação acrítica dos procedimentos de composição da gestão justificados unicamente na letra da lei, é preciso ampliar o esteio de legitimação da instituição conferindo maior representatividade com instrumentos de democracia direta e participativa, aliás esta gestão na reitoria introduziu a consulta eletrônica para aferir as posturas presentes na universidade sobre seu destino, portanto, não está unicamente ou preferencialmente sobre a norma a eficácia dos usos e costumes do governo das coisas civis, das coisas do espírito deixemos a outro instante .
A trajetória republicana não é retilínea, ela comporta tensões diversas, se o processo civilizatório já pode ser observado na presença de direitos iguais entre homens e mulheres, nem assim a sociedade superou a configuração de desigualdade social. A condição republicana almejada por nós não prescinde o reconhecimento de perspectivas diferentes na organização da estrutura do estado. Retomando o impasse da ocupação na UNB, percebemos como a proposta do professor Roberto Aguiar, outrora membro dos nossos quadros nos anos oitenta, da paridade do voto entre as três categorias na eleição de reitor, sensibilizou os discentes para desocuparem a reitoria, demonstrando ser a solução não uma imposição da norma, mas a efetiva mobilização da sabedoria para indicar uma alternativa. Porque isso deve ser taxado como interesse subterrâneo para a tomada do poder? Não nos esqueçamos “Alea jacta est” é um artifício de um César que pretende derrubar a república pela força ao atravessar com suas legiões o Rio Rubicão. O mérito acadêmico se funda na norma ou no debate franco?
[1] TV. Humaitá 2018, AP 502